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Quando o todo é (muito) mais que a soma das partes

Written by Adrianna Virmond on January 13th, 2020. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

O que a evolução de espécies, as rotas de transporte de mercadorias e a eleição democrática de representantes têm em comum? Do ponto de vista da física (e da matemática), tudo!

O último Papos de Física de 2019 aconteceu no dia 7 de novembro e, para fechar o ano, abordamos uma temática inusitada: Sistemas Complexos e o olhar da Física. Sistemas complexos formam uma área de estudo relativamente nova, naturalmente interdisciplinar, que tem reunido físicos, matemáticos, biólogos, sociólogos e até mesmo economistas, para resolver questões em comum. O professor Daniel Stariolo, da Universidade Federal Fluminense (UFF), foi ao Tubaína Bar falar um pouco sobre o assunto e a perspectiva da física dentro desta área.

 

O professor Daniel Stariolo conversou sobre Sistemas Complexos e como a física ajuda a entendê-los.

 

Stariolo começou a apresentação ilustrando a natureza interdisciplinar dos sistemas complexos e sua ocorrência nas mais diversas áreas de ciências e fora dela, desde os ecossistemas do planeta, planejamento de transporte e estradas, organizações sociais, evolução… O ponto em comum entre todos eles é o fato de funcionarem em redes e serem, de alguma forma, internamente conectados entre si. Os sistemas complexos podem ser naturais, que evoluíram para serem da forma como são hoje (como os ecossistemas, os organismos, o clima) ou podem ser artificiais, criados pelo homem para funcionarem do modo que conhecemos atualmente (a economia, as redes de distribuição de energia, o sistema de transporte e as redes sociais).

Alguns elementos são essenciais e caracterizam os sistemas complexos. Os principais são a existência de muitos agentes, a conectividade (relação entre os agentes) e a existência de vínculos conflitantes (ou seja, relações competitivas). Porém, não basta que esses elementos existam. Algumas propriedades do sistema surgem como consequência das características individuais dos agentes: são as chamadas propriedades emergentes.

 

As interações entre as partes de um sistema complexo criam padrões complexos de funcionamento coletivo. Em outras palavras, propriedades emergentes são criadas por conta da interação entre os agentes do sistemas, mas não estão presentes individualmente em cada uma das partes. Por exemplo, a interação entre os neurônios no seu cérebro permitem que você leia e entenda esse texto. Porém, um único neurônio não seria capaz de realizar a mesma atividade. Uma pessoa levantar e abaixar os braços não implica em nada; porém milhares de pessoas fazendo isso (organizadamente) nas arquibancadas de um estádio cria uma “ola”.

 

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Dentre as inúmeras propriedades emergentes de um sistema complexo, Stariolo destacou auto organização, múltiplas escalas e complexidade.

A auto organização é inerente ao sistema e é o conjunto de regras internas que faz ele funcionar. Essa rede de relações e regras gera um fluxo de informações entre os indivíduos do sistema e, em geral, é bastante complexa para entender, e, principalmente, modelar. Quando inserido em um sistema, o indivíduo fica sujeito a essas leis de funcionamento. Por exemplo, quando começamos num trabalho novo, temos que entender (e nos adequar) a dinâmica do ambiente e suas regras, sejam elas de comportamento ou vestimenta; quando viajamos a países estrangeiros, devemos atender às leis daquele lugar e estamos sujeitos à sua constituição (via de regra… Em geral, Direito é bem mais complexo do que isso!).

As múltiplas escalas também são muito presentes nos sistemas complexos. Os próprios sistemas em geral são compostos de subsistemas, mas podem interagir com outros sistemas maiores, gerando redes de relação em escalas diferentes. Embora cada escala tenha suas regras próprias, elas se relacionam umas com as outras e também podem interferir umas nas outras.

Para entender as escalas diferentes, imagine seu corpo. Ele é formado por órgãos – pulmão, coração, rins, etc. Alguns órgãos atuam juntos e formam sistemas – respiratório, digestório, cardiovascular – e todos eles juntos formam você, que é também um sistema complexo. Se diminuirmos a escala, cada órgão é formado por tecidos diferentes – muscular, nervoso, epitelial – e cada tecido é formado por tipos específicos de célula. Ou seja, a medida que aumentamos ou diminuímos a escala, observam-se padrões e a ocorrência de sistemas complexos, com organização e regras próprios, mas que interferem uns nos outros.

 

O conceito de Complexidade é estudado e utilizado em diversas áreas de conhecimento, em ciências humanas, da vida e exatas, e a própria definição é controversa. No Papos de Física, Stariolo definiu a complexidade dos sistemas complexos pela possibilidade de existirem múltiplos equilíbrios possíveis para o sistema em questão. E usou a evolução de espécies para ilustrar isso. 

 

A evolução a partir da seleção natural envolve inúmeros indivíduos (são 8,7 milhões de formas de vida hoje, sem considerar as já extintas!), explora as relações entre eles (sejam harmônicas ou desarmônicas, onde nenhuma ou alguma das partes sai prejudicada) e certamente apresenta vínculos conflitantes (sobrevivência do “mais apto”). Mas não só isso, as propriedades emergentes, citadas por Stariolo, também estão presentes: a evolução cria e modifica seus próprios padrões não-lineares e portanto é auto organizada; ela ocorre em múltiplas escalas, sejam elas temporais ou espaciais; e apresentam grande complexidade, ou seja existem muitos equilíbrios (ou espécies) possíveis – é bem provável que outras combinações de espécies estariam presentes no mundo hoje, caso alguma coisa tivesse acontecido diferente no passado. Entender em detalhe quais as relações e as regras da evolução têm sido o desafio dos biólogos (e físicos!) nos últimos anos.

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Árvore da vida. A evolução não é um processo linear como normalmente imaginado pelo senso comum. Trata-se de um exemplo de sistema complexo com diversos agentes atuantes. (Fonte: ZernLiew)

 

O problema do caixeiro viajante

Um dos exemplos clássicos que o professor trouxe foi o conhecido “Problema do Caixeiro Viajante”. O problema é, conceitualmente, simples: qual a menor rota possível para o caixeiro passar (somente uma vez) por todas as cidades de um determinado grupo de cidades e voltar para o ponto inicial.

A princípio, pode parecer uma pergunta boba ou sem sentido, mas, na verdade, soluções desse problema têm aplicações diretas e indiretas em diversas áreas, desde planejamento e logística no transporte de mercadorias, até produção de microchips, sequenciamento de DNA e astronomia.

A origem do problema é relativamente incerta: existem registros de que esse problema tenha sido proposto no século 19, mas foi considerado matematicamente apenas na década de 30. Já nessa época, Karl Menger, um dos matemáticos que teria estudado o problema, concluiu a necessidade de um algoritmo potente para resolvê-lo e postulou que a solução “óbvia”, que comumente vem primeiro à mente, geralmente não é a resposta certa. Ele se referia a regra “do ponto mais próximo” em que, partindo de uma cidade, a rota deveria seguir sempre para a cidade seguinte mais próxima. Embora essa solução pareça razoável, nem sempre a soma total dos deslocamentos será a menor possível – e portanto, não responde ao problema original.

Stariolo mostrou um vídeo durante sua apresentação, e vamos fazer o mesmo aqui. Basicamente, o vídeo apresenta quatro respostas usando, cada um, uma abordagem diferente, para o problema: qual a menor rota possível para ligar as 200 cidades do vídeo.

O primeiro método é selecionar aleatoriamente as cidades até que todas tenham sido visitadas. Ou seja, é “deixar a vida te levar”. Essa abordagem que pode funcionar muito bem quando você está viajando a lazer e resultou no percurso de 327452.4 km percorrido entre as cidades.

O segundo método é o de escolher sempre a cidade mais próxima – a solução “óbvia” que vêm à mente, como falado nos parágrafos anteriores. Provavelmente seria a solução que um turista um pouco mais preparado teria escolhido. No caso do vídeo, a distância total percorrida seria 36226.2km.

A terceira abordagem utiliza o método inicial, criando uma rede aleatória, mas o otimiza, sempre selecionando 2 pontas para trocar. A não ser que seu problema a resolver seja trivial, escolher quais pontas trocar é complicado. Assim, a solução é que o algoritmo faça trocas aleatórias até que encontre a menor rota. O problema dessa abordagem é que, por conta do caminho inicial escolhido, o algoritmo empaca numa solução que não é a melhor possível – e pode ser um “mínimo local”, que não necessariamente é o mínimo global do seu sistema. Nesse caso, o viajante teria percorrido 31887.0 km

 

Maxima vs Minima and Global vs Local 1 (i2tutorials)

Para entender o mínimo local, imagine um vale com montanhas bem altas, mas que também tem montanhas menores ao redor. Pode ser que, procurando o ponto mais baixo entre as montanhas, você caia num vale entre uma montanha grande e uma pequena, mas não necessariamente no ponto mais baixo de todas as montanhas ali (Fonte:i2tutorials)

 

Como melhorar isso? Utilizando uma técnica probabilística chamada recozimento simulado (simulated annealing), que tem suas origens na termodinâmica.

Para resolver o problema do caixeiro viajante, usar o recozimento simulado permite aceitar probabilisticamente soluções ruins no início da busca. Quanto tempo a busca pelo menor caminho vai durar é medida de acordo com uma temperatura hipotética para o sistema. No início da busca, a temperatura é alta e a chance de aceitar resultados ruins é maior. Com a diminuição da temperatura, também diminui a probabilidade de que a resposta obtida não seja a ideal. No caso do vídeo, o caminho ideal entre as 200 cidades é encontrado quanto a “temperatura do sistema” é 0.4, encontrando uma solução de 30944.3 km.

 

Recapitulando… a abordagem completamente aleatória percorreria 327 mil quilômetros; ligando sempre o ponto mais próximo, a segunda, 36,2 mil km; a terceira, usando otimização, 31,9 mil km; e, por fim, a quarta, que usa otimização e recozimento simulado, 31,0 mil km.

Claramente, o método do turista “deixa a vida me levar” é o mais longo de todos – e às vezes esse pode até ser o objetivo do turista. Mas quando falamos do transporte de cargas e da logística de mercadorias, é interessante para as empresas gastar o mínimo possível, ou seja, tomar a menor rota possível.

A diferença mais expressiva é entre o ‘viajar sempre para a cidade mais próxima’ e os métodos probabilísticos mais robustos. Considere um caminhão viajando constantemente a 80km/h e cujo desempenho seja 29 litros/100km. A alternativa 2, indo sempre à cidade mais próxima, gastaria 10500 litros ao longo de 453 horas (ou seja, 18.9 dias corridos). Usando a melhor das rotas calculadas, seriam utilizados 1530 litros de combustível a menos, e 2,8 dias seriam economizados na conta do motorista. Se você imaginar grandes companhias com milhares de caminhoneiros transportando mercadoria todos os dias, isso faz uma baita diferença!

Método Distância (km) Combustível* Tempo de percurso**
  1. Método aleatório
327452,4 94961 4093 h 170,5 d
  1. Cidade mais próxima
36226,2 10506 453 h 18,9 d
  1. Otimização 2 pontos
31887,0 9247 399 h 16,6 d
  1. Recozimento simulado
30944,3 8974 387 h 16,1 d
(*) em litros, considerando consumo de 29 L /100km
(**) em horas e dias, considerando velocidade constante de 80km/h

 

Mas o que física tem a ver com isso tudo?

Primeiramente, princípios de física são utilizados para entender como funciona a natureza. Sistemas complexos ocorrem nas mais diversas escalas e nos mais diversos locais na natureza, então é esperado que a física poderia ser usada para estudá-los. Além disso, a física já tem um conceito que está relacionado o grau de desordem de um sistema – a entropia – e uma área de estudo que se propõe a estudá-la: a termodinâmica.

A termodinâmica pode ser estudada tanto pela mecânica clássica, com as leis de Newton, quanto pela mecânica quântica, com todas as estranhezas intrínsecas ao mundo do muito pequeno. Mas, quando tratamos de uma quantidade muito grande de objetos a serem estudados – moléculas, átomos, elétrons -, é necessário usar a física estatística. A ideia é aliar probabilidade e estatística para caracterizar o comportamento médio (ou probabilístico) de sistemas microscópicos onde existam muitos elementos interagindo. Stariolo ainda comenta que a física estatística é, grosso modo, a termodinâmica na escala microscópica.

Vale lembrar que nem todo sistema estudado com física estatística é um sistema complexo, por conta das outras características intrínsecas deles, como já mencionado neste texto. Um sistema complicado de entender não necessariamente é um sistema complexo! Mesmo assim, a física estatística é uma ferramenta para o estudo dos sistemas complexos, e rompe as barreiras do mundo micro – com ela é possível estudar desde os átomos e moléculas, até as redes sociais e a economia mundial.

 

O Papos de Física é um evento mensal de divulgação científica promovido pelo ICTP-SAIFR no Tubaína Bar (R. Haddock Lobo, 74). Todo mês, levamos pesquisadores para conversar com o público leigo sobre assuntos intrigantes da física, em palestras descontraídas e informais. Fique ligado para os eventos de 2020 no nosso instagram e na página!

 

Para saber mais sobre sistemas complexos e a física por trás deles:

SAIFR Divulga!A Mecânica Estatística só se aplica a fenômenos físicos?

http://www.cbpf.br/~desafios/media/livro/Sistema_complexos.pdf

 

Bate-papo sobre um dos temas mais polêmicos da atualidade: o Aquecimento Global

Written by Adrianna Virmond on November 13th, 2019. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

No dia 03 de outubro aconteceu mais uma edição do Papos de Física, evento mensal de divulgação científica promovido pelo ICTP-SAIFR, centro de pesquisa associado ao IFT-UNESP. Nesta edição o público pôde conversar com a profa. Dra. Ilana Wainer, professora do Instituto Oceanográfico da USP (IO-USP), que discutiu os Efeitos Climáticos do Oceano.

A professora Ilana Wainer (IO-USP) explicou sobre as mudanças climáticas e quais evidências científicas comprovam sua existência.

 

Algumas semanas antes da realização do Papos de Física, o IPCC (Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas) divulgou o mais recente Relatório Especial sobre o Oceano e a Criosfera (regiões da superfície terrestre cobertas permanentemente por gelo e neve). Aproveitando os dados divulgados neste relatório, a professora apresentou as principais evidências que comprovam o aquecimento global e quais as perspectivas (otimistas ou não) sobre o futuro do planeta.

 

Antes de mais nada, a professora esclareceu a diferença entre tempo e clima. Tempo compreende as condições e mudanças meteorológicas que estão ocorrendo no agora. Clima, por outro lado, compreende padrões médios de variação das condições atmosféricas ao longo de um período prolongado de tempo. Assim, falar que está fazendo sol é falar sobre o tempo, mas falar que normalmente em janeiro faz calor e chove, é falar sobre clima. Quando falam de aquecimento global e mudanças climáticas, os cientistas olham para esses padrões de variação ao longo do tempo, em escalas globais.

 

Mas antes de entrar no polêmico aquecimento global, vamos entender um pouco sobre a influência dos oceanos no clima.

 

O planeta Terra, como um todo, é um sistema complexo onde diversos agentes se relacionam. Isso se aplica também ao clima, que é influenciado e atua sobre a biosfera (que comporta os ecossistemas do planeta), a litosfera (rochas e estrutura interna terrestre), a hidrosfera (água em seus diferentes ambientes) e, obviamente, a atmosfera (camada de gases que envolve o planeta). As interações entre essas diferentes “esferas” ocorrem em escalas espaciais e temporais distintas, mas todas exercem algum impacto no controle do clima global. No Papos de Física de outubro, Ilana focou nas interações entre atmosfera e hidrosfera (em especial, os oceanos) e seu efeito sobre o clima.

 

Ilana explicou que os oceanos são como o ar condicionado da Terra e têm um papel fundamental na redistribuição de calor no planeta. A água retém mais calor que a atmosfera e, por conta das correntes oceânicas, o calor é distribuído. As correntes são divididas entre correntes superficiais, mais quentes, e correntes de fundo oceânico, mais frias. Elas são influenciadas por diversos fatores, incluindo ventos, marés, densidade da água e o movimento de rotação da Terra. Até a topografia do fundo oceânico e das costas influencia na velocidade das correntes.

 

Mesmo que as marés exerçam influência nas regiões próximas às costas, a principal força motriz das correntes superficiais é a atmosfera.

 

A ação dos ventos movimenta mais ou menos 10% do volume do oceano, atuando diretamente nas camadas mais superiores de água. Estas, por sua vez, influenciam a movimentação das camadas logo abaixo, e assim por diante. Dessa forma, os ventos podem influenciar o movimento de água até a profundidade de 400m.

 

Mas os oceanos são muito mais profundos do que 400m. Se os ventos só conseguem influenciar até essa profundidade, deve haver outro mecanismo responsável pela movimentação das correntes profundas, certo? Exato. As correntes profundas são controladas, principalmente, pela densidade da água do mar.

 

Ao se movimentar em direção aos pólos, a temperatura da água diminui. Nessas regiões, a salinidade é maior, ou seja, a concentração de sal dissolvido aumenta – isso ocorre porque parte da água é aprisionada em cristais de gelo, deixando as moléculas de sal para trás, concentradas na água líquida. A água mais fria e “salgada” é mais densa que a água que chega nessas regiões e afunda, criando correntes de movimentação vertical chamada circulação termoalina. A movimentação de águas profundas em direção à superfície também carrega nutrientes que sustentam a base das cadeias alimentares marinhas.

 

Correntes superficiais quentes (vermelho) e correntes profundas, frias (azul). Essas grandes correntes de circulação de água funcionam como um “ar condicionado” do planeta. (Imagem: NASA).

 

A ação conjunta das correntes oceânicas superficiais e profundas mantém o equilíbrio do clima no planeta todo. Ou pelo menos costumava manter… Apesar da complexidade do sistema controlando o clima, o equilíbrio é, na verdade, frágil, e “pequenas” perturbações podem ter consequências grandes.

 

Como sabemos que o planeta está aquecendo?

 

No IPCC centenas de cientistas de todo o mundo recolhem dados sobre o clima global para avaliar os impactos do aquecimento global. Comprova-se que o planeta está, de fato, aquecendo a partir de diversos indicadores. Vamos conhecer alguns deles?

Diversos indicadores mostram que a temperatura média do planeta está aumentando e que as mudanças climáticas são reais. Veja o texto para entender um pouco mais sobre cada indicador.

 

Diminuição das geleiras

Talvez o mais conhecido e impactante indicador do aquecimento global é o derretimento das geleiras. Imagens de satélite mostram a cobertura de gelo marinho no Ártico cada vez menor nas últimas décadas.

 

Umidade específica do ar

A umidade específica do ar também tem aumentado no passar dos anos. Isso significa mais vapor d’água no ar. A princípio, ter mais água não parece um problema, mas, na verdade, o vapor d’água é um gás estufa poderosíssimo e contribui para o aumento da temperatura.

 

Calor dos oceanos

Também há registro do aumento do conteúdo de calor nos oceanos. Já existem evidências de que as temperaturas estão aumentando na superfície dos oceanos e até os primeiros 700m de profundidade. Isso afeta diretamente os frágeis ecossistemas marinhos, e também a população que depende dele para se alimentar.

 

Aumento do nível do mar

Diversas localidades já registram aumento do nível do mar no mundo. Isso é causado tanto pelas taxas aceleradas de derretimento das geleiras do Ártico, como também pela expansão térmica dos oceanos (por conta do aumento de temperatura). Estima-se que atualmente o nível do mar sobe 3.6 mm por ano.

 

Temperatura da baixa atmosfera

A atmosfera é dividida em algumas camadas, de acordo com a distância em relação ao solo. Nós habitamos a troposfera, a camada mais baixa, que compreende até 12km de altitude, e fica abaixo da camada de ozônio. Medidas sistemáticas da temperatura dessa camada mostram que ela tem esquentado nos últimos anos. Aliás, comparado à época pré-Revolução Industrial, a temperatura já subiu 1°C! Isso acontece por que os gases de efeito estufa se acumulam na atmosfera e retém o calor irradiado da superfície e elevando a temperatura.

 

 

A atmosfera do planeta é dividida em camadas: troposfera, estratosfera, mesosfera, termosfera e exosfera. Nós habitamos a troposfera, a camada mais baixa, que vai até 12km de altura. Um pouco acima disso, se encontra a conhecida camada de ozônio (Fonte freepik user).

 


Aliás, o que é o Efeito Estufa?

 

Primeiro, precisamos saber que o Efeito Estufa é natural e, na verdade, garante a vida na Terra.

 

Na agricultura, as estufas são utilizadas para cultivar plantas mais sensíveis, e que não sobreviveriam ao clima no exterior. Dentro de uma estufa, a radiação solar passa pelas paredes de vidro e é absorvida pelas plantas e outras estruturas dentro dela. Parte da radiação é irradiada de volta, mas fica presa conta das paredes de vidro. Dessa forma, é possível cultivar plantas independente das variações climáticas das estações do ano. De forma semelhante, o planeta Terra também está dentro de uma estufa – a nossa atmosfera.

 

Quando a radiação solar chega na Terra, parte dela é refletida de volta para o espaço pelas camadas mais externas da atmosfera. Uma outra pequena parcela é refletida de volta para o espaço nas grandes geleiras, por conta da cor branca dessas superfícies. O restante é absorvido pelos oceanos e massas de terra do planeta. A Terra irradia parte do calor absorvido de volta para o espaço, mas uma porcentagem acaba presa na atmosfera, por conta dos gases do efeito estufa existentes, e isso mantém o planeta aquecido. Se não fosse esse efeito, a Terra poderia ser até 33°C mais fria, o que inviabilizaria a vida por aqui (pelo menos nas formas como a conhecemos hoje). 

 

Os gases do efeito estufa incluem vapor d’água, dióxido de carbono (conhecido como gás carbônico – CO2), metano (CH4), óxido nitroso (N2O), ozônio e os componentes clorofluorcarbonos (CFCs). Com exceção dos CFCs, que são utilizados para refrigeração, todos esses gases são naturais e estão presentes na atmosfera terrestre, em proporções variadas. A grande questão é que o estilo de vida que levamos hoje, com grande dependência de combustíveis fósseis e emissão de gases, potencializa o efeito estufa, contribuindo para o aumento da temperatura do planeta.

 

O efeito estufa ocorre naturalmente no planeta e garante temperaturas amenas. O problema é a intensificação do efeito, por conta da emissão de gases do efeito estufa (Imagem mundoeducacao).

 

E para onde vai esse calor em excesso? Por enquanto, para o oceano (uma das causas do aumento da sua temperatura). Estima-se que os oceanos sejam responsáveis por absorver cerca de 93% do calor em excesso da atmosfera. Por enquanto, eles são capazes de fazer isso, mas Ilana alertou que já estamos nos aproximando de um “ponto de inflexão”, e que talvez os oceanos não sejam capazes de absorver o calor em excesso por muito tempo. As consequências disso podem ser severas, acelerando as mudanças que já estão ocorrendo e aumentando ainda mais a temperatura.

 

Como as mudanças climáticas já estão afetando o planeta?

 

  • O aquecimento do oceano é acompanhado da diminuição do pH e diminuição da quantidade de O2 dissolvido na água. O resultado é morte de parte significativa da vida marinha e alteração do equilíbrio químico dos oceanos;
  • Além disso, o aquecimento do oceano prejudica a mistura entre camadas de profundidades diferentes, gerando a estagnação da água. Isso implica em menos oxigenação das camadas e menor circulação de nutrientes, também impactando a vida marinha;
  • O nível do mar já aumentou em algumas partes do planeta. As mudanças variam de lugar para lugar, mas é importante lembrar que quase 2 bilhões de pessoas moram a menos de 100km da costa, e toda essa população está em perigo com variações drásticas do nível do mar;
  • Chuvas, ciclones tropicais e outros eventos extremos que atingem as costas têm se intensificado;
  • O aumento do nível do mar também é associado com maior incidência de inundações, enchentes, secas, erosão e danos para infra-estrutura de regiões próximas à costa, desaparecimento de ilhas oceânicas e contaminação de aquíferos;
  • Cenários otimistas prevêem o aumento do nível do mar em 60cm até 2100, isso caso sejam implementadas, agora, medidas e políticas públicas comprometidas com a diminuição da emissão de gases de efeito estufa. Em cenários mais pessimistas, onde não existe controle algum, calcula-se que a elevação pode ser de até 1 metro!

 

Com as predições do novo relatório do IPCC, Ilana alertou que devemos cobrar posicionamento e políticas públicas dos governantes, para ajudar a conter as mudanças climáticas no mundo todo. Alguns efeitos já são irreversíveis, como apontou a pesquisadora, e é necessário agir agora para evitar que os cenários mais pessimistas se concretizem.

 

O Papos de Física é um evento mensal de divulgação científica promovido pelo ICTP-SAIFR, que ocorre todo início de mês no Tubaína Bar (R. Haddock Lobo, 94). Nesses eventos, físicos levam assuntos de ciência que despertam curiosidade do público para uma conversa informal e descontraída, de forma acessível a todos. A última edição do ano, aconteceu no dia 07 de novembro, com o tema “Sistemas Complexos: o Olhar da Física”. Fique atento ao blog para saber como foi o evento e nas nossas redes sociais para saber da programação de 2020!

 

Para saber mais sobre mudanças climáticas:

Um papo sobre a expansão do Universo

Written by Adrianna Virmond on October 3rd, 2019. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

No dia 12 de setembro ocorreu mais uma edição do Papos de Física, e dessa vez o público pôde assistir o professor Eduardo Cypriano (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas –  IAG-USP) falar sobre os “Desafios da Cosmologia Observacional”. Eduardo começou a palestra fazendo um panorama geral do que se entende por Cosmologia atualmente, como ela funciona e quais os desafios futuros.

Nossos ancestrais, há milhares de anos, voltaram os olhos para o céu estrelado e tentaram dar significado para aqueles pontos brilhantes que tanto nos fascinam. Desde então, praticamente todas as civilizações das quais se têm registro, criaram mitos e histórias que, de alguma forma, explicavam os porquês do céu ser do jeito que é. Hoje, Cosmologia é a área da ciência que se ocupa em entender o Universo como um todo.

Fotos do Papos de Física de Setembro/2019. Eduardo Cypriano, professor do IAG-USP, discutiu com o público os Desafios da Cosmologia Observacional (Créditos das imagens: ICTP-SAIFR).

Apesar das contribuições de cientistas como Galileu, Newton e Kepler, foi com Einstein e a Teoria da Relatividade Geral que surgiu uma revolução na maneira como entendemos o Universo. A teoria, que explica a gravitação, introduziu a ideia de espaço-tempo, mostrou a existência da relação entre massa e energia, e resolveu o problema da órbita de Mercúrio: a órbita de todos os planetas se modifica um pouco ao longo do tempo, mas os cálculos feitos para a órbita de Mercúrio não batiam com as observações, até que a Relatividade Geral foi incorporada nas contas. A Relatividade Geral prevê diversos outros fenômenos que hoje estamos verificando, como as ondas gravitacionais, detectadas diretamente em 2015 (clique aqui para saber mais!), e a existência de buracos negros, comprovada pelo primeiro registro “fotográfico” de um, em abril de 2019.

 

Porém, como lembrou Cypriano, Einstein não estava completamente correto em alguns pontos, entre eles, o fato de considerar nosso universo finito e estático. A partir das equações de Einstein, Friedmann, um físico e matemático russo, descreveu leis que previam a expansão do Universo, considerando que ele seria homogêneo e isótropo (ou seja, igual em todas as direções). Mas foi com as contribuições de Henrietta Leavitt que, anos mais tarde, Lemaitre e Hubble comprovaram a expansão do Universo.

 

Henrietta Leavitt foi uma astrônoma americana, responsável pela descoberta da existência de uma relação entre o período e a luminosidade de cefeidas, um tipo de estrela. Esta constatação deu origem ao método utilizado para medir as distâncias entre astros. Com esse método, as distâncias entre a Terra e várias estrelas e galáxias começaram a ser medidas até que Lemaitre e Hubble, independentemente, observaram uma relação linear entre a distância e a velocidade com a qual as galáxias estão se movendo, e atribuíram essa relação à expansão do Universo. Assim, estes cientistas mostraram que, ao contrário do que pensava Einstein, o Universo não é finito e estático e está, na verdade, se expandindo.

Cefeidas são um tipo de estrela pulsante, ou seja sua luminosidade aumenta e diminui em intervalos de tempo bem definidos. Esse intervalo é denominado período, e existe uma relação linear entre a luminosidade e o período das cefeidas. Essa relação é utilizada para calcular a distância e a velocidade das estrelas, assim os cientistas determinaram o tamanho, idade e taxa de expansão do universo. LMC: Grande Nuvem de Magalhães, uma galáxia satélite à Via Láctea (em inglês – Large Magellanic Cloud); Milky Way: Via Láctea. (Créditos da imagem: NASA/JPL-Caltech/Carnegie, dados do Telescópio Spitzer).

 

Sabemos que o Universo está se expandindo. Assunto encerrado, certo? Na verdade, constatar que o Universo está expandindo levanta muitas outras questões: o universo vai expandir para sempre? A expansão ocorre sempre à mesma velocidade, ou está retardando? Ocorre um processo cíclico, no qual o Universo alterna entre expandir-se e contrair-se infinitamente? Qual o futuro do Universo?

 

O professor mostrou que essas questões têm relação direta com a própria geometria do Universo, e que existem três modelos possíveis: num universo fechado, o modelo que se adequa melhor aos cálculos é o de alternância de ciclos de expansão e contração; num universo aberto, com pouca massa, os cálculos prevêem que o cosmos se expandirá para sempre; e na terceira opção, onde a geometria do universo seria plana, o universo deve possuir uma densidade específica, uma “massa crítica”, e dessa forma ele está se expandindo agora, mas cada vez a taxas menores, de forma que, um dia, atingirá um tamanho máximo.

Depois de confirmar a expansão do Universo, surgem questões como: se está expandindo agora, já contraiu antes? Qual a taxa de expansão? Vai expandir para sempre, ou eventualmente ocorrerá o colapso do universo todo? Como evolui o universo ao longo do tempo? (Créditos da imagem: UFRGS)

 

Como resolver essa questão?

Primeiramente, os astrônomos determinaram a densidade do universo. Cada um dos modelos geométricos funciona para valores específicos de densidade, e por isso essa era uma das saídas. O problema é que a densidade calculada foi um valor diferente do esperado, e, na verdade, não era exatamente equivalente aos valores de nenhum dos modelos, mas sim a um valor intermediário.

 

A alternativa encontrada pelos astrofísicos foi calcular as velocidades e distâncias de estrelas ainda mais distantes. A ideia seria que, para esses corpos tão distantes, já seria possível observar a desaceleração do Universo. E funcionou! Utilizando supernovas como referência, foi possível “enxergar” lugares ainda mais afastados no universo e calcular suas distâncias e velocidades com as quais galáxias distantes se deslocam. Mas… Mais uma vez, o universo pregou uma peça nos cientistas. Certos de que encontrariam a taxa de desaceleração do universo (ou seja, quanto a velocidade diminui com o tempo), os cientistas se surpreenderam ao encontrar um valor negativo.

Ou seja: o universo não está expandindo cada vez mais devagar, mas sim cada vez mais rápido!

 

Nesse momento, o professor Eduardo aproveitou a oportunidade para explicar um pouco sobre o Método Científico e a importância de aplicá-lo no fazer científico. Ao longo da história da ciência, repetidamente os cientistas se surpreenderam com os resultados de seus cálculos e experimentos. No fazer científico, faz parte do processo ter de repensar (e muitas vezes descartar) a hipótese original, tendo em vista os resultados das observações e experimentos. Este episódio da descoberta da expansão do Universo é um bom exemplo sobre como os pesquisadores devem se apoiar no método, e não apenas em suas intuições.

O método científico é parte fundamental do fazer científico e, embora tenha variações de acordo com a área de estudo, é um guia geral de como fazer ciência de forma imparcial e acurada. Esse infográfico mostra como o bioquímico e escritor Isaac Asimov explica resumidamente o método (Créditos da imagem: Via Saber).

 

Voltando ao assunto… Porque o universo está se expandindo, e cada vez mais rápido? É justamente isso que os astrofísicos estão tentando resolver agora. Esses são os novos Desafios da Cosmologia Observacional. Essa aceleração é atribuída à Energia Escura, uma energia que existe no universo, mas que os físicos ainda não entendem como funciona. Além disso, hoje sabemos que quase toda a massa do universo é formada, na verdade por Matéria Escura, cuja natureza também é pouco compreendida (veja aqui um dos candidatos para compor a matéria escura). “Talvez seja necessário desenvolver uma ‘nova física’ para explicar esses fenômenos” finalizou o professor Eduardo Cypriano.

 

O Papos de Física é um evento mensal de divulgação científica realizado pelo ICTP-SAIFR, centro de pesquisa associado ao IFT-UNESP, no Tubaína Bar (R. Haddock Lobo, 74, Cerqueira César). Num ambiente descontraído e informal, físicos falam sobre os avanços da ciência e temas que despertam a curiosidade da população. Ao final de cada apresentação, o cientista convidado responde perguntas do público. A próxima edição acontecerá no dia 03 de outubro, e contará com a presença da professora Ilana Wainer (IO-USP), que falará sobre os “Efeitos Climáticos do Oceano”.

O físico que usa o núcleo do átomo como laboratório

Written by Malena Stariolo on May 9th, 2018. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

Gastao Krein é um dos convidados do primeiro dia do Pint of Science. Ele falará sobre “A flecha do tempo: por que envelhecemos e nunca rejuvenescemos?”, em uma apresentação descontraída no Tubaína Bar.

O físico acabou escolhendo essa carreira inspirado por livros, principalmente sobre gravitação, enquanto estava no Ensino Médio.

Filho de pai ferreiro e mãe dona de casa, Gastao foi sempre incentivado a fazer o que gostasse para conseguir encontrar um rumo e “não se perder na vida”. Desde pequeno o cientista sempre teve muita facilidade com matemática, mas foi no ensino médio que ele realmente decidiu ser físico.

Antes disso, entretanto, o pesquisador colocou como sonho ser jogador de futebol chegando a treinar no Internacional de Porto Alegre, apesar de ser gremista. Com divertimento, ele lembra de um dia estar saindo do vestiário enquanto outra turma voltava do campo, “entrou um cara super franzino, cabeça vermelha, todo suado e fraquinho. Eu pensei, ‘se a competição for com esse aí eu acho que vou conseguir ser jogador’. Depois fiquei sabendo que aquele menino era o Paulo Roberto Falcão, um dos maiores jogadores que já apareceu”.

Tendo que deixar a ideia de se tornar jogador de futebol de lado, o gosto pela física surgiu no final do primeiro ano quando, incentivado por um professor, começou a frequentar a biblioteca da escola para ler os livros da coleção PSSC (Physical Science Study Committee) elaborado no MIT, principalmente a parte sobre gravitação, “eu nunca tinha pensado que a mesma força que puxa os objetos para o chão é a mesma que atua entre o Sol e a Terra. Aquilo foi meio marcante, então eu comecei a ler mais e mais e mais”. Assim, no fim do ensino médio, o cientista prestou vestibular diretamente para física.

“Na época eu trabalhava na Varig, então eu pensei em engenharia também, mas depois de ter mais contato com a física decidi que era aquilo que queria. Quando entrei no curso eu tinha a ideia de que conseguiria fazer as disciplinas e continuar trabalhando, mas um professor me convenceu que eu não teria futuro nenhum se eu levasse o curso à meia-boca, então decidi largar o emprego”, relata.

Já em meados de sua graduação o cientista conseguiu uma bolsa de iniciação científica com um professor de física nuclear, o que terminou por definir á área na física na qual ele queria se especializar: física nuclear na interface com a física de partículas. Durante sua tese, entretanto, enfrentou uma grande dificuldade, ele estava de frente com um problema que não tinha uma solução simples. “Eu tive que fazer toda a garimpagem da literatura para a minha tese e achar a forma de resolver por conta própria, então teve momentos de desânimos. Mas acabou tudo bem, achei a forma de resolver e consegui publicar dois artigos”, comenta.

Sua tese, e sua área de pesquisa, estão voltadas para a física nuclear moderna, que olha para dentro do próton e do nêutron. Assim, o objetivo maior não era entender o núcleo, ele era apenas um “laboratório” usado para entender o que eram o próton e o nêutron “e isso vai até hoje”, brinca.

Entre seus momentos marcantes Gastao lembra do primeiro artigo publicado e da bolsa que conseguiu, ao fim do doutorado, para ir aos Estados Unidos realizar o pós-doutorado. Segundo Gastao, esse foi um dos melhores lugares para sua área e lhe deu a possibilidade de publicar 13 artigos em dois anos, concedendo-lhe uma experiência profissional e pessoal muito marcante. Ao fim dessa etapa voltou para a Universidade de Santa Maria, onde era Professor Titular e dava aulas na graduação e, logo em seguida, veio um novo salto em sua carreira ao conseguir aprovação num concurso para trabalhar no IFT – UNESP, onde está até hoje.

Gastao Krein é um dos convidados da próxima edição do Papos de Física, dentro da programação do Pint of Science, e irá falar sobre “A flecha do tempo: por que envelhecemos e nunca rejuvenescemos?”. Sua apresentação será no primeiro dia, 14 de maio, segunda-feira, no Tubaína Bar (R. Haddock Lobo, 74 – Cerqueira César) às 19:30. No mesmo dia o físico Alberto Saa fará a palestra “O conceito de infinito na física e matemática”. Para a programação completa e mais informações acesse Papos de Física  e Pint of Science – São Paulo.

Marcelo Yamashita, o Diretor do IFT – UNESP

Written by Malena Stariolo on May 8th, 2018. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

Um dos palestrantes do segundo dia do Pint of Science será o diretor do IFT, Marcelo Yamashita. Especializado em física quântica de poucos corpos, o físico passou por algumas reviravoltas em seu percurso até chegar onde está hoje.

O pesquisador fará uma palestra sobre “Ciência versus Pseudociência”

Durante a adolescência Marcelo Yamashita nunca soube muito bem o que gostaria de ser, então quando chegou o momento, começou a planejar seu futuro pensando em seguir Engenharia Civil, dedicou os estudos para o vestibular com esse objetivo em mente. Tudo mudou quando, seis meses antes de realizar a tão aguardada prova, a admiração por um professor o fez traçar um novo percurso. Apesar de achar que seu pai ficaria um pouco decepcionado por conta da expectativa de ter um filho engenheiro, tanto ele, quanto a mãe, apoiaram a decisão final do estudante de ir atrás de seu novo interesse: a física.

Mesmo com a mudança repentina de carreira, seu percurso acadêmico foi tranquilo. Desde o começo gostou do curso e se envolvia pelo que era ensinado, aprendendo tudo com grande prazer. Talvez esse gosto, aliado à disciplina que Marcelo tinha devido há anos praticando judô, ajudaram para que a vida universitária não apresentasse grandes dificuldades. Mesmo assim, o pesquisador não passou intocado pelas incertezas que, às vezes, atingem jovens durante a graduação, “Qualquer atividade apresenta momentos desagradáveis. O ser humano também tem uma busca por aquilo que é novo. Várias vezes já pensei em desistir da física, mas ainda bem que o pensamento passou logo”, comenta.

Aliás, a mudança de carreira não foi a única reviravolta na vida acadêmica do cientista. Desde sua iniciação científica até o mestrado, Marcelo se dedicou à área experimental da física para, só no doutorado, perceber que aquilo não era o que realmente queria e seguir um novo rumo no lado teórico da física:

“A minha iniciação científica e meu mestrado foram experimentais numa área chamada espectroscopia gama. Experimental no sentido de colocar a mão na massa em experimentos: carregar tijolos de chumbos, apertar parafusos, etc. Fiquei uns seis anos fazendo isso para descobrir que realmente não gostava de tudo aquilo. Comecei a estudar a minha área atual de pesquisa, a física quântica de poucos corpos, no ano 2000, no meu doutorado. Desde então tenho trabalhado em assuntos relacionados”.

Como o físico descreve, atualmente suas pesquisas estão direcionadas para o estudo de núcleos e moléculas muito fracamente ligadas. Ele está interessado em observar como moléculas resfriadas a temperaturas próximas de zero absoluto se modificam conforme mudam a dimensão espacial do sistema, ou seja, a alteração dessas moléculas quando transitam em espaços tri, bi e unidimensionais. Além de pesquisador, Marcelo, atualmente também é o Diretor do Instituto de Física Teórica da UNESP, um dos melhores institutos de física do país.

Apesar da física por si só parecer uma área extremamente complicada para a maioria das pessoas, ela nunca se tratou da maior dificuldade do cientista. A parte burocrática e administrativa de seu cargo é o que realmente o deixa enrolado, e tira um pouco do foco que ele gostaria de dedicar à outras atividades mais interessantes, “acho que a minha maior dificuldade agora é fazer relatórios e prestações de contas. Por conta da minha atual posição também não consigo me concentrar na minha pesquisa da maneira que eu gostaria”, explica.

Marcelo Yamashita é um dos convidados da próxima edição do Papos de Física, que está dentro da programação do Pint of Science, e irá falar sobre “Ciência versus Pseudociência”. Sua apresentação será no segundo dia, 15 de maio, terça-feira, no Tubaína Bar (R. Haddock Lobo, 74 – Cerqueira César) às 19:30. No mesmo dia o físico Oscar Eboli fará a palestra “Constituentes da Matéria: elétrons, quarks, Higgs”. Para a programação completa e mais informações acesse Papos de Física e Pint of Science – São Paulo.

Um pé na física experimental e outro na teórica

Written by Malena Stariolo on May 7th, 2018. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

Oscar Eboli é um dos convidados para o segundo dia do Pint of Science, e fará uma palestra sobre “Constituentes da Matéria: elétrons, quarks, Higgs”. Apesar de ter se formado em Engenharia Elétrica, Oscar sempre foi apaixonado pela física e construiu uma carreira empolgado por poder fazer aquilo que gosta.

Oscar Eboli, falará sobre os Constituentes da Matéria no segundo dia do Pint of Science

Com o pai engenheiro, desde cedo Oscar foi sempre estimulado a seguir pelo mesmo caminho. Por conta disso, o futuro não foi diferente, o professor acabou cursando Engenharia Elétrica chegando a se formar no curso por “falta de coragem de abandonar”, como ele comenta. Porém, desde seu último ano na escola ele começou a desenvolver uma paixão pela física, nas aulas os professores mostravam as construções das fórmulas e as lógicas por trás de leis e regras que sempre estiveram presentes nos estudos, e aquilo foi encantando Oscar.

O encanto foi tanto que, mesmo indo para seu segundo ano de engenharia, o então aluno prestou vestibular e conseguiu ingressar no curso de física da USP. E, assim, frequentou os dois cursos paralelamente, o que não era uma tarefa fácil. Durante a manhã se dedicava às aulas da Escola Politecnica enquanto a noite estava reservada para as aulas do Instituto de Física. Quando, por fim, formou-se não teve dúvida, iniciou logo um mestrado e deu adeus para a engenharia, sem nunca sequer se preocupar em tirar o CREA ou voltar a se envolver com aquela área, mesmo com as influências do pai engenheiro.

“Entrar de vez na física, no mestrado, foi algo tão natural para mim. Era a coisa que eu realmente gostava, então, mesmo quando eu estudava de noite, eu não me importava, eu gostava do que estava acontecendo”, lembra o físico.

Oscar entrou no IF da USP em 1976, como aluno, mas desde então sempre esteve em contato com o local. Cursou o mestrado ali mesmo e, apesar de ter saído por um tempo para se doutorar, acabou voltando e concluindo o doutorado em São Paulo. Mais tarde, teve a oportunidade de realizar o pós-doc no MIT, mas logo depois voltou para o departamento, onde foi prontamente contratado, “eu já tive quatro empregos, comecei na UNESP, mudei para a USP, aí fui para o IFT e depois voltei para a USP. Decidi não mudar mais, porque alteraram a aposentaria, então fiquei quieto”, brinca.

Verdadeiramente apaixonado por sua profissão, Oscar nunca pensou em desistir da física ou seguir outro rumo. Mesmo depois de anos trabalhando percebeu sua sorte por ser “pago para fazer aquilo que gosta”. Inclusive comenta que, se pudesse fazer tudo de novo, a única coisa diferente seria abandonar a engenharia. Quando questionado sobre o qual parte mais lhe fascina na física, comenta “eu gosto da estrutura lógica, eu gosto da mistura de matemática com realidade. De entender o universo que nos cerca em termos de leis simples, isso é bonito”.

Atualmente as pesquisas do cientista estão na área de Física de Colisores, ele descreve seu trabalho como uma interface entre a teoria e o experimento. O trabalho consiste em entender as teorias que lhe são apresentadas e buscar uma forma de testá-las em máquinas. Assim, o pesquisador vive entre os mudos da física experimental e da teórica.

Explicando um pouco melhor, Oscar fala sobre a descoberta do bóson de Higgs, “quando conseguimos os dados das descobertas, com base no que foi possível ser observado, nós começamos a levantar questões como ‘é o Higgs do modelo padrão? Era aquilo que estava sendo previsto?’ A partir disso você faz modificações no modelo padrão já existente, compara com os dados e pode concluir ‘dentro da quantidade de informações coletadas, isso está dentro do padrão’”. Desde sua descoberta, o professor continua trabalhando, principalmente, com teorias e informações a respeito do Higgs.

Além da física Oscar tem outros vícios: a Coca-cola, como brinca, mas principalmente jogar tênis. Durante seu período como estudante a universidade “obrigava” os alunos a fazerem aulas de educação física, assim formou um grupo de tênis com a turma da engenharia. O gosto pelo esporte foi tanto que o hobby era usado como desculpa até para fugir de aulas consideradas “muito chatas”. Assim, desde aquela época, Oscar se viciou na atividade e faz questão de jogar pelo menos três vezes por semana, mesmo quando viaja procura locais onde possa jogar para ter suas horas de lazer e divertimento garantidas.

Oscar Eboli é um dos convidados da próxima edição do Papos de Física, que está dentro da programação do Pint of Science, e irá falar sobre “Constituentes da Matéria: elétrons, quarks, Higgs”. Sua apresentação será no segundo dia, 15 de maio, terça-feira, no Tubaína Bar (R. Haddock Lobo, 74 – Cerqueira César) às 19:30. No mesmo dia o físico Marcelo Yamashita fará a palestra “Ciência versus Pseudociência”. Para a programação completa e mais informações acesse Papos de Física e Pint of Science- São Paulo.

Victor Rivelles, cientista desde criança

Written by Malena Stariolo on May 3rd, 2018. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

O físico será um dos palestrantes do último dia do Pint of Science e falará sobre a Teoria de Cordas. Muito antes de se envolver com a física, Victor já buscava formas de realizar experimentos em casa e aprender mais sobre esse campo.

Professor Victor Rivelles, pesquisador nas áreas de Gravitação Quântica, Supercordas, Supersimetria e Supergravitação

Na infância de Victor, ciência era um assunto que estava na moda, a corrida espacial estava em seu auge, atraindo a atenção de muitas pessoas. Ele lembra de observar os tios e o pai discutindo como funcionavam foguetes e computadores – que naquela época se chamavam cérebros eletrônicos. Certamente, estar no meio desse período de efervescência científica, serviu de influência para que Victor começasse a se sentir atraído por aqueles temas.

Quando tenta pensar em outros incentivos, ele comenta que seu pai era técnico de rádio e televisão e tinha uma oficina na própria casa o que permitia a Victor acopanhar seus trabalhos e até mesmo se envolver no conserto de alguns equipamentos. Assim, ele foi aprendendo a soldar resistências, capacitores, trocar válvulas de televisões. Por outro lado, os tios de Victor também buscavam formas de incentivar o garoto, com frequência eles traziam compostos químicos para que ele fizesse experiências e visse como cada produto reagia. Com tudo isso, o cientista conseguiu montar um pequeno laboratório onde, com auxílio de livros, realizava suas experiências.

À medida que crescia Victor percebia que, apesar de gostar de todas as áreas da ciência, ele tinha uma predileção especial por química e física. A primeira chamava a atenção porque seus experimentos e resultados eram coisas mais perceptíveis, ele podia ver como os compenentes mudavam de cor, como um composto reagia com o outro, enquanto a segunda não oferecia essa percepção visual do que estava acontecendo. Por outro lado, estudando começou a achar a física muito mais fundamental, fazendo com que ele buscasse se aprofundar naquilo. Assim, o pesquisador, no seu último ano da escola, decidiu seguir esse caminho.

A vontade de estudar campos foi o que, mais tarde, veio a definir a área na qual o pesquisador iria se especializar. Durante a graduação desenvolveu um interesse grande por Relatividade Geral e Mecânica Quântica, duas áreas fundamentais da física. Victor lembra de dois professores que serviram de incentivo, “através deles eu comecei a ver o que estava acontecendo na fronteira da física. Foi aí que eu descobri a existência de quarks e buracos negros. As pessoas ainda procuravam entender como as partículas interagiam entre si, se os buracos negros existiam e isso parecia fundamental para descobrir aquilo que realmente interessava”. Por essas e outras influências, hoje Victor faz pesquisas nas áreas de Gravitação Quântica, Supercordas, Supersimetria e Supergravitação.

Quando foi questionado por alguma situação curiosa em sua carreira, Victor lembrou de uma experiência um tanto quanto única: “Eu estava em uma reunião na China, na qual o Stephen Hawking também compareceu. Nessas conferências sempre organizam um jantar onde todos os participantes vão, no final colocaram música e, para minha surpresa, eu vi o Hawking, na cadeira de rodas, dançando acompanhado de uma mulher. Ele estava sorridente, muito contente, ele era uma pessoa que aproveitava a vida. Eu o vi várias vezes, mas essa é uma lembrança muito marcante”.

Victor Rivelles é um dos convidados da próxima edição do Papos de Física, que está dentro da programação do Pint of Science, e irá falar sobre o que é a teoria de cordas. Sua apresentação será no último dia, 16 de maio, quarta-feira, no Tubaína Bar (R. Haddock Lobo, 74 – Cerqueira César) às 19:30. No mesmo dia o físico Odylio Aguiar fará a palestra “Ondas Gravitacionais: prêmio Nobel de Física de 2017”. Para a programação completa e mais informações acesse Papos de Física e Pint of Science – São Paulo.

O relativista Alberto Saa

Written by Malena Stariolo on May 2nd, 2018. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

O físico fará uma palestra no primeiro dia do Pint of Science, na qual falará sobre o conceito de infinito na física e matemática. Essas duas áreas sempre foram uma paixão para ele, mesmo quando pequeno. Conheça um pouco mais sobre a trajetória do palestrante. 

Alberto Saa ao lado del Culo de la Leona em Gerona.

Quem é aluno do professor Alberto Saa pode não desconfiar mas, na verdade, ele é uma pessoa bem tímida. Filho de uma família de imigrantes espanhóis e natural de São Paulo, Alberto fez a graduação, mestrado e doutorado no Instituto de Física da USP e se considera “cria dessa casa”. Depois de ter passado o pós-doutorado viajando por vários países da Europa, o professor conseguiu um emprego na UNICAMP, o que o fez voltar para a terra onde tinha crescido. Nesse ponto Alberto brinca “como todo paulistano, eu tinha um enorme preconceito com o interior do Estado… E eu acabei conseguindo um emprego na UNICAMP” ele ri ao lembrar da situação, e completa “mas a verdade é que eu sou muito feliz lá. Eu me arrependo de ter tido esses preconceitos, talvez, se eu tivesse conhecido o interior do estado antes, poderia ter sido melhor”. De fato, Alberto se sentiu tão bem que trabalha até hoje na UNICAMP como professor titular de física-matemática.

Ao contrário da maioria das pessoas, Alberto não se lembra quando começou a se interessar por ciência. Pensando em retrospectiva e tentando encontrar o momento que esse interesse teve início, o professor percebeu que parece que esse gosto foi algo que esteve sempre presente em sua vida. “Minha mãe conta que teve uma fase que eu era alucinado com a ideia de ser espião, mas eu tenho a impressão que ela interpretou mal os meus sinais, acho que eu queria ser cientista mesmo. Eu não tenho outras lembranças que não fossem de eu querendo me envolver com ciência”. Quando era pequeno sua diversão era montar circuitos elétricos, um hobby que aprendeu praticamente sozinho antes de entrar no colégio, depois, começou a criar gosto pelos livros do Isaac Asimov e como eles discutiam o impacto da ciência no mundo normal.

À medida que foi crescendo, apesar de gostar de todas as áreas da ciência, Alberto começou a desenvolver um interesse particular por matemática e física, tanto que, quando estava pensando qual curso queria seguir na graduação, a grande dúvida era exatamente qual dessas áreas ele iria escolher. A decisão ficou mais clara quando começaram as aulas de cálculo e ele foi capaz de perceber como o conteúdo estava intimamente conectado com problemas físicos. “Acho que não é exagero dizer que eu fui atraído para a física pela matemática”, comenta.

Mas, assim como muitas pessoas, a trajetória em um curso nem sempre é simples. Alberto teve muitos colegas que desistiram durante o percurso, outros tantos que se frustraram com expectativas inalcançáveis. Entretanto, quando questionado a respeito, ele diz que percebe que o que lhe dava forças para continuar era não criar expectativas grandiosas, como ganhar um Nobel, mas as pequenas realizações do cotidiano que o emocionavam e o inspiravam para continuar pesquisando e aprendendo.

“Eu tinha prazer em descobrir pequenas coisas. Então, resolver um exercício difícil me dava prazer. No meu trabalho de pesquisa, me dá prazer descobrir alguma coisa que é absolutamente irrelevante para qualquer um que não esteja pensando naquilo. O fato de você ter feito uma pequena descoberta, que não vai mudar absolutamente nada a vida da humanidade, mas que é um problema que várias pessoas pensaram durante muitos, muitos anos, e nunca conseguiram resolver, o fato de eu conseguir, me dá algum prazer. E eu acho que só consegui continuar nisso porque eu tenho prazer nessas pequenas descobertas do dia-a-dia”.

Hoje, Alberto Saa é um relativista, o que significa que ele é um especialista em Relatividade Geral. Do ponto de vista físico e do ponto de vista matemático a Relatividade Geral tem duas áreas muito diferentes. Por um lado está a Cosmologia, que é a descrição do universo inteiro, enquanto do outro estão os Sistemas Estelares, que trabalham com a descrição de corpos isolados, como estrelas e buracos negros. As pesquisas de Alberto estão voltadas mais para a área de problemas estelares, e quase todos os seus trabalhos têm uma motivação ou aplicação em física de buracos negros.

Alberto Saa é um dos convidados da próxima edição do Papos de Física, que está dentro da programação do Pint of Science, e irá falar sobre o conceito do infinito na física e na matemática. Sua apresentação será no dia 14 de maio, segunda-feira, no Tubaína Bar (R. Haddock Lobo, 74 – Cerqueira César) às 19:30. No mesmo dia o físico Gastao Krein fará a palestra “A Flecha do Tempo: Porque envelhecemos e nunca rejuvenescemos”. Para a programação completa e mais informações acesse Papos de Física e Pint of Science São Paulo.

Em busca do lado escuro do Universo

Written by Malena Stariolo on April 16th, 2018. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

Na última edição do Papos de Física a professora de física, Ivone Albuquerque, falou sobre a misteriosa matéria escura e sobre o quão pouco conhecemos o nosso universo 

A professora Ivone Albuquerque falando sobre matéria escura no Tubaína Bar

“Quando você olha para o céu, o que você vê?” Com esse questionamento a professora Ivone Albuquerque, começou a discussão sobre “O lado escuro do universo”. Pesquisadora na área de astrofísica de partículas, a cientista foi a convidada do mês de abril para realizar mais uma edição do Papos de Física, que aconteceu na  primeira quinta-feira do mês, dia 05 de abril, no Tubaína Bar. Voltemos a pergunta que deu início a palestra e a essa matéria, o que você vê quando olha para o céu?

Se for em São Paulo, não muita coisa, como brincou a professora, mas se nos afastarmos um pouquinho mais e fazermos nossa observação em um local longe de toda a iluminação da grande cidade, poderemos ver milhões de pontinhos brilhantes na escuridão que representam milhões de astros espalhados pelo universo. A grande responsável por nos permitir essa experiência, e por nos tornar capazes de ver qualquer objeto a nossa volta, é a luz.

A luz, por si só, carrega muita informação que astrônomos e cosmólogos usaram ao longo do tempo para aprender mais sobre o espaço no qual estamos inseridos. Por meio dela podemos determinar, por exemplo, qual é a distância de uma estrela até o nosso planeta, com base no tempo que a luz percorre até alcançar a Terra. Por isso a medida de distância utilizada na astronomia é calculada em anos/luz. Quando se diz que um objeto está a 2,5 milhões de anos-luz, como é o caso da Galáxia de Andrômeda, significa que sua luz demorou 2,5 milhões de anos para chegar até nós, ou seja, muitos dos pontinhos brilhantes que vemos no céu podem não existir mais! Olhar para o céu, é olhar para a história do universo.

A luz visível está contida em uma pequena parte do chamado “espectro eletromagnético”, uma escala que também inclui ondas de rádio, micro-ondas, infravermelho, ultravioleta, raios-X e raios gama. Apesar dessas ondas serem imperceptíveis para nossa visão, elas carregam informações que podem ser medidas e analisadas com telescópios. Assim, tudo o que nós sabemos sobre os astros é determinado pela luz que chega até nós em suas diferentes faixas. Isso é uma indicação de que a matéria que nós conhecemos interage com a luz de diversas formas, o que nos permite descobrir suas propriedades e estudá-las, a partir da luminosidade dos astros podemos descobrir sua massa, por exemplo. Além do método do brilho, existe uma outra forma de determinar a massa das galáxias: usando o método orbital. Nesse método, esse cálculo é feito a partir das velocidades e dos raios orbitais das estrelas pertencentes a galáxia em estudo.

Espectro da Luz

Por volta de 1930, o físico Fritz Zwicky estudando o aglomerado de galáxias Coma, localizado a 300 milhões de anos luz da Terra, percebeu que a massa total obtida pelo método orbital era muito maior do que a massa total obtida pelo método de brilho. E ainda dentro dessa análise, já que massa e velocidade estão relacionadas, as velocidades individuais das galáxias dentro desse aglomerado eram tão grandes que provocariam a desagregação do aglomerado, o que obviamente não estava acontecendo. Zwicky concluiu que deveria haver uma grande quantidade de matéria invisível (matéria escura) segurando e mantendo coeso esse aglomerado graças à gravidade. Na época, os dados coletados pelo astrônomo traziam muitas incertezas o que fez com que a teoria fosse deixada de lado.

Isso até os anos 70, quando a cientista Vera Rubin estudando as velocidades orbitais das estrelas em Andrômeda, surpreendeu-se com o comportamento apresentado por estrelas distantes do centro dessa galáxia: ao invés de comportarem-se como os planetas do sistema solar, que diminuem sua velocidade conforme aumenta a distância em relação ao sol, estas permaneciam constantes. Vera Rubin concluiu que isso só seria possível se houvesse matéria escura em grande quantidade na parte mais exterior dessa galáxia. Assim foi confirmada a existência de matéria escura, mas não apenas isso, também foi determinado que, de toda a matéria que compunha o universo, 85% era desconhecida. A matéria escura ficou “escondida” por tanto tempo porque ela não interage de forma alguma com a luz, ou seja, não havia forma de observar sua existência.

Nessa situação, aquela velha frase de Sócrates “só sei que nada sei” é muito pertinente, porque mesmo hoje, com todo o avanço na tecnologia, conhecemos apenas 15% do universo, enquanto todo o resto permanece como um grande mistério. Mas, ao contrário da década de 30, agora cientistas do mundo inteiro não economizam energia em busca de formas de descobrir mais informações sobre a matéria escura, um componente tão misterioso quanto essencial do nosso universo.

Apesar de ainda não ter sido diretamente observada, ao longo dos anos foram surgindo diferentes indícios que comprovam sua existência, como a professora Ivone apresentou em sua fala: “Hoje existem várias outras observações completamente independentes das rotações de galáxias que indicam a existência de matéria escura, e o mais interessante é que elas indicam que a necessidade de matéria escura é a mesma quantidade que a determinada pela rotação de galáxias. Uma dessas medidas é o efeito chamado de lentes gravitacionais, previsto inicialmente por Einstein. Basicamente, ele indica que quando a luz se propaga pelo universo, a presença de matéria faz com que ocorra uma distorção no caminho dela. Ou seja, surgem trajetórias curvas devido a presença de matéria. O ângulo dessa curvatura depende da quantidade de matéria que ela atravessa, portanto, o ângulo de distorção nos permite determinar quanta matéria tem nessa galáxia. E, ao fazer essa medida, você chega na mesma conclusão que na rotação de galáxias. Mais uma vez a existência de matéria escura está confirmada”.

Fotografia retratando o efeito de lentes gravitacionais, notem como a trajetória da luz está curva

Outro efeito que a cientista demonstrou por meio de uma animação (que você pode ver abaixo) foi a colisão de dois aglomerados de galáxias. Quando dois aglomerados passam um pelo outro a matéria escura, por não interagir com a luz, também não interage com a matéria conhecida, fazendo com que ela passe reto pela colisão, enquanto a matéria “comum” se choca e interage mesclando-se. “A matéria escura, em azul, passa como se a outra galáxia não existisse e no meio, a matéria conhecida interage e se concentra. Se você medir onde está a maior parte da matéria depois dessa colisão, você vai ver que ela está na região azul, confirmando que a maior parte passa sem colidir, já que ela basicamente não interage em termos da luminosidade”, explicou.

E do que é composta a matéria escura? Essa é uma pergunta ainda sem resposta. “Nós já sabemos algo muito importante, nós sabemos que ela é composta por nada que conhecemos. Esses 15% de matéria conhecida, nós conhecemos muito bem e sabemos que ela não compõe a matéria escura”, destaca a cientista. Hoje diversos laboratórios no mundo buscam formas de tentar medir partículas que compõe a matéria escura para tentar encontrar uma definição. Ivone lembra que uma das grandes questões da física é conseguir determinar do que o universo é composto e, sermos capazes de, em algum momento, decifrar do que essa misteriosa matéria escura é composta seria um grande passo em busca de uma resolução para esse problema.

O Papos de Física é um evento mensal de divulgação científica, organizado pelo ICTP – SAIFR, que convida físicos para falarem, de forma descontraída, sobre novos avanços e outros temas que despertam nossa curiosidade. No próximo mês o evento fará parte da programação do Pint of Science Brasil, então acontecerá de uma forma um pouquinho diferente, serão três dias de debates com 2 palestrantes em cada dia.

  • No dia 14 de maio, uma segunda-feira, teremos o professor Gastao Krein (IFT-UNESP) falando sobre “A flecha do tempo: por que envelhecemos e nunca rejuvenescemos?” e Alberto Saa (UNICAMP) com “O conceito de infinito na física e matemática”;
  • Dia 15 de maio, terça-feira, os convidados são Oscar Eboli (IF-USP) que apresentará “Constituintes da matéria: elétrons, quarks, Higgs…” e Marcelo Yamashita (IFT-UNESP) para discutir “Ciência versus pseudociência”;
  • Por último, no dia 16 de maio, quarta-feira, teremos Odylio Aguiar (INPE) com uma apresentação sobre “Ondas Gravitacionais: prêmio Nobel de Física de 2017” e Victor Rivelles (IF-USP) com “O que é a teoria de cordas?”.

O local continua sendo o de costume: Tubaína Bar (R. Haddock Lobo, 74 – Cerqueira César). Fique atento ao site do ICTP para mais informações!