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Ondas Gravitacionais: “O próximo passo é o inesperado”

Written by Malena Stariolo on March 15th, 2018. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

Após a detecção e, mais recentemente, a observação de ondas gravitacionais uma nova porta se abre para os estudos da física e da astrônomia.

(Fonte: NASA)

Na última semana o ICTP-SAIFR promoveu o minicurso Gravitational Waves for Field Theorists ministrado pelo professor Rafael Porto. Uruguaio de nascensa, o pesquisador é um físico teórico que trabalha com os aspectos fundamentais e observacionais da gravidade e com a Teoria Quântica de Campos. Dentro de sua linha de pesquisa se encontram seus trabalhos com Ondas Gravitacionais.
As Ondas Gravitacionais (Gravitational Waves) são definidas como ondulações do espaço-tempo, elas se espalham pelo universo na velocidade da luz, ou seja: 299.792 km/s. Em geral, as ondas gravitacionais mais poderosas são geradas a partir da colisão de objetos que se movem a velocidades muito grandes. É o caso de quando dois buracos negros se fundem, ou quando duas estrelas de nêutrons colidem.

(Geração de ondas gravitacionais. Fonte: LIGO Caltech)

Infelizmente esses eventos apresentam uma grande dificuldade de detecção porque ocorrem a distâncias muito grandes e, quando finalmente chegam na Terra, as ondas já estão muito fracas para serem identificadas. É simples de imaginar o fenômeno se pensarmos em uma lagoa, alguém joga uma pedra no meio dela, no momento do impacto da pedra com a água as ondulações formadas serão maiores e bem perceptíveis, entretanto, quanto mais próximas da beirada, menores elas serão e, portanto, será mais difícil diferenciá-las.
As ondas gravitacionais foram previstas pela primeira vez por Albert Eistein em 1916, em sua Teoria Greral da Relatividade, na qual propunha que os corpos mais violentos do espaço liberam parte de sua massa através de energia por meio dessas ondas. Porém, pelo fato de serem tão difíceis de detectar e, consequentemente, comprovar, o próprio Eistein duvidava da veracidade de sua teoria. Foi só quase um século depois, em 2015, que sua existência foi 100% confirmada através de um detector super sensível, desenvolvido pela colaboração da equipe do Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro Laser (LIGO).
O experimento, considerado um dos mais caros e ambiciosos em décadas, consiste em duas instalações, localizadas no estado de Washington e Louisiana. Apresenta um formato em L e, cada braço, percorre uma extensão de 4km completamente em linha reta. Por ser extremamente sensível a variações, o experimento está localizado em regiões distantes de cidades ou de qualquer fonte de interferência, para evitar uma detecção falsa. Em seu interior um raio laser gerado é dividido nos dois sentidos do L e percorre o interior de cada tubo, no fim de sua extensão espelhos super estáveis refletem os lasers de volta. Em geral, os lasers percorrem os tubos, são refletidos e retornam exatamente na mesma frequência, entretanto essa calmaria é alterada quando uma onda passa pela Terra gerando uma vibração.
Até 2017 nós tivemos a oportunidade de detectar cinco ondas gravitacionais, todas geradas por buracos negros. Entretanto, em Agosto de 2017 mais um avanço surpreendente: pela primeira vez cientistas conseguiram não apenas detectar as ondas, mas também observá-las. O evento teve origem do choque de duas estrelas de nêutrons, na constelação de Hydra, há 130 milhões de anos atrás. Essas estrelas são extremamente pequenas, entretanto, super densas, em média elas têm 19km de extensão mas sua massa é equivalente a de um sol e meio. O interessante dessa observação é que, por terem campos eletromagnéticos, as estrelas de nêutrons podem causar explosões de ondas eletromagnéticas o que nos permite ver o fenômeno ao apontar um telescópio em sua direção. Assim, foi possível não apenas detectá-las, como também observá-las.

(Registro da explosão de estrelas de nêutros. Na figura 1 no momento da expĺosão em 17 de Agosto de 2017 e, na Figura 2, o evento desbotado alguns dias depois, em 21 de Agosto de 2017. Fonte: 1M2H TEAM/UC SANTA CRUZ & CARNEGIE OBSERVATORIES/RYAN FOLEY)

A detecção das ondas gravitacionais abriu um campo inteiramente novo de pesquisas e especulações na astrônomia e na física, permitindo novas formas de compreensão do universo e de sua origem. As ondas carregam consigo informações de sua criação, que remetem há milhões de anos atrás, nos permitindo identificar como elas surgiram e quais eram as características da sua fonte. Assim, é possível expandir nosso conhecimento sobre fenômenos até agora muito pouco explorados, como os buracos negros, além de permitir um estudo sob um novo ângulo a respeito das vibrações do espaço-tempo. Rafael Porto, destaca que o próximo passo é o inesperado, as ondas gravitacionais podem ser utilizadas para a exploração do universo em busca de novos objetos como também para o estudo em busca de conhecimento preciso sobre fenômenos já conhecidos.
“Nós não sabemos o que está lá fora, podem ser buracos negros, estrelas de nêutros, ou pode ser algo completamente exótico e novo que nós ainda não conhecemos. Para conseguir extrair informação e diferenciar o que sabemos do que não sabemos nós precisamos estudar o que nós chamamos de wave forms (formato de ondas), predições super precisas do que nós conhecemos, para comparar com as observações e ver se existe uma incompatibilidade o que nos permitirá falar ‘ok, isso é algo novo’. Uma possibilidade é a existência de estrelas feitas de matéria que nós ainda não vimos, ou buracos-negros podem ter o que nós chamamos de “pêlos”, eles podem estar rodeados por uma condensação de muitas partículas que nós não conhecemos, existe também a matéria escura que nós ainda não observamos diretamente. Então, através das ondas gravitacionais, nasce uma forma realmente nova de olhar para o universo”.
Apesar de acreditar que o próximo grande avanço na área vai acontecer daqui a muitos anos, Porto se mostra otimista sobre as novas possibilidades de estudo que a observação de ondas gravitacionais apresenta. Em relação à comunidade não científica ele defende que não existe como não se interessar por avanços como esse, que permitem a criação de um imaginario inteiramente novo sobre as origens do nosso universo.