Archive for February, 2016

Observação de ondas gravitacionais geradas pela fusão de um sistema binário de buracos negros

Written by Ricardo Aguiar on February 18th, 2016. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

Por Riccardo Sturani

No dia 11 de Fevereiro foram anunciadas duas descobertas de grande importância científica diretamente relacionadas com uma das previsões mais importantes da teoria da Relatividade Geral de Einstein: a primeira detecção direta de ondas gravitacionais e a primeira observação da colisão e fusão de um par de buracos negros.

Este evento cataclísmico, conhecido como GW150914, ocorreu em uma galáxia distante mais de um bilhão de anos-luz da Terra. Ele foi observado em 14 de Setembro 2015 às 6:51 hora de Brasília pelos dois detectores do Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferometria Laser (sigla LIGO em Inglês).

Da morfologia do sinal podemos deduzir as massas dos buracos negros: 32 e 29 massas solares com uma incerteza de aproximadamente 20%, das quais podemos estimar, através da Relatividade Geral, que a energia emitida na forma de ondas gravitacionais ao longo da coalescência foi cerca de 3 vezes a massa do Sol, a maioria emitida em uma fração de segundo. O pico de luminosidade correspondente  é aproximativamente de 1056 ergs/s. Para comparação, a luminosidade do sol é de 4 × 1033 erg/s e aquela do gamma ray burst mais luminoso nunca observado é de ∼ 5 × 1054 erg/s no caso de emissão isotrópica.

A fusão de dois buracos negros formou um único buraco negro de massa correspondente a 62 vezes a do Sol. Além disso, se conclui que o buraco negro remanescente tem spin correspondendo a um buraco negro de Kerr, com um valor aproximativamente de 0.67. Esses resultados indicam que GW150914 ocorreu à um redshift de cerca 0.09.

O avanço marca o começo de uma nova era em astronomia abrindo uma nova janela de observação do universo sob a forma de ondas gravitacionais.

As ondas gravitacionais são oscilaçãoes do espaço-tempo causadas por qualquer massas aceleradas. Nas últimas décadas, já se havia acumulado fortes evidências de que as ondas gravitacionais existem, devido a seus efeitos em órbitas próximas de pares de estrelas de nêutrons em nossa galáxia. Os resultados destes estudos concordam muito bem com a teoria de Einstein possuindo exatamente o mesmo decaimento orbital previsto pela teoria e que é devido à perda de energia transportada por ondas gravitacionais. No entanto, a detecção direta de ondas gravitacionais tem sido amplamente desejada pela comunidade científica já que esta descoberta iria fornecer maneiras novas e mais robustas para testar a relatividade geral sob condições extremas, abrindo uma nova maneira para explorar o universo.

Os valores estimados das massas antes da fusão dos dois componentes de GW150914 são em si um argumento muito forte para assegurar que os dois são buracos negros, especialmente se consideramos a pequena separação das duas componentes necessária para gerar um sinal da frequência observada: o sinal entra na banda do LIGO acerca de 30 Hz e atinge uma frequência máxima de 250 Hz. Os buracos negros são os únicos objetos conhecidos que são suficientemente compactos para estarem tão perto sem se fundirem.

Essa é a primeira observação de um par de buracos negros, mas não se trata da primeira observação de buracos negros em geral.

Embora, por definição, não possamos “ver” a luz de um buraco negro, já que são densos e compactos que nem mesmo a luz poderia escapar de sua atração gravitacional, astrônomos reuniram uma importante coleção de evidências de sua existência estudando os efeitos desses candidatos a buracos negros na área ao redor deles. Por exemplo, acredita-se que a maioria das galáxias, incluindo a Via Láctea contém um buraco negro supermassivo (∼ 106 vezes a massa do Sol) no seu centro – com massas de milhões ou até bilhões de vezes maior que a do Sol. Também existem evidências de buracos negros com massas muito menores (de poucas vezes até uma dúzia de vezes a massa do Sol), que se acredita serem restos de estrelas mortas que sofreram uma explosão cataclísmica, chamado de um colapso do núcleo supernova.

Além destes progressos substanciais na observação indireta de buracos negros, a nossa compreensão teórica desses estranhos objetos foi drasticamente melhorada na última década por avanços notáveis na capacidade de simular em computador desde as várias órbitas muito próximas até a fusão de um sistema binário de buracos negros. Estes modelos permitiram a criação de ondas gravitacionais emitidas por buracos negros: o conhecimento de como essas evoluem à medida que os buracos negros ficam mais próximos até finalmente se fundirem em um único buraco negro mais massivo é necessário para maximizar as informações que podemos tirar da observação.

LIGO é o maior observatório de ondas gravitacionais e um dos mais sofisticados experimentos de física do mundo. Composto por dois grandes interferômetros a laser localizados a ∼ 3000 Km de distância, em Livingston, Louisiana e Hanford, Washington, LIGO usa as propriedades físicas da luz e do espaço para detectar ondas gravitacionais – um conceito que foi proposto pela primeira vez nas décadas de 60 e 70. Um primeiro conjunto de detectores foi concluído no início de 2000, incluindo TAMA300 no Japão, GEO600 na Alemanha, LIGO nos Estados Unidos e Virgo na Itália. Em seguida, e usando combinações destes detectores, foram feitas observações conjuntas entre 2002 e 2011, sem se obter qualquer detecção de ondas gravitacionais. Depois de melhorias significativas realizadas, os detectores LIGO começaram a operar em 2015 como LIGO Avançado: os primeiros de uma rede global de detectores significativamente mais sensíveis. Os LIGO estão agora desligados, o reinicio da tomada de dados é prevista em conjunto para o final desse ano.

Um interferômetro como o LIGO consiste de dois braços perpendiculares (no caso do LIGO estes braços medem 4 km) em que um feixe de laser é enviado e refletido pelos espelhos no final dos braços. Quando uma onda gravitacional passa, a ampliação e o encolhimento do espaço faz com que os braços do interferômetro se alonguem e encolham alternadamente, um fica menor enquanto o outro fica maior e vice-versa. Como os braços alteram de comprimento por efeito das ondas gravitacionais, os feixes a laser viajam distâncias diferentes através dos braços, o que significa que os dois feixes não estão mais em fase e logo é produzido o que chamamos de padrão de interferência.

A diferença entre o comprimento dos dois braços é proporcional à intensidade da onda gravitacional que está passando: em uma onda gravitacional típica, supõe-se que esta amplitude de deformação deva ser, aproximadamente, menor que o diâmetro de um próton! Ainda assim os interferômetros LIGO são tão sensíveis que eles podem medir esses valores extremamente pequenos.

Para detectar com sucesso uma onda gravitacional como GW150914, os detectores LIGO precisam combinar uma grande sensibilidade com a capacidade de isolar os sinais reais das fontes de ruído instrumental: pequenas perturbações devido, por exemplo, a efeitos ambientais ou ao próprio instrumento, poderiam imitar ou superar os padrões de ondas gravitacionais que estamos buscando. Com dois detectores disponíveis temos a vantagem de poder separar o sinal real da onda gravitacional de possíveis ruídos e perturbações.

Operar uma rede de dois ou mais detectores também nos permite, por triangulação, posicionar a direção no céu da onda gravitacional observada uma vez conhecida a diferença de tempo de chegada em cada detector. Quanto mais detectores na rede, mais precisa será a localização no céu da fonte emissora desta onda gravitacional. Em 2016, o detector Virgo Avançado, na Itália, vai juntar-se à rede global – além de estar prevista a construção de outros interferômetros avançados como o KAGRA no Japão e um terceiro LIGO na Índia.

A caracterização do ruído de fundo é uma parte essencial da pesquisa do LIGO, e envolve o monitoramento uma grande coleção de dados ambientais gravados nos dois locais: movimento do solo, variações da temperatura e flutuações da potência do laser, entre outros, que são monitorados em tempo real para controlar o estado dos interferômetros. Um problema em um desses canais ambientais ou instrumentais causa o descarte dos dados recolhidos pelo detector.

Além disso, para excluir a possibilidade de uma flutuação de ruído incomum, LIGO estimou a probabilidade dessa coincidência acontecer acidentalmente através de uma série de deslocamentos de tempo entre os dados do LIGO Hanford e LIGO Livingston, para criar um conjunto de dados de maior duração e para procurar sinais coincidentes que sejam atribuídos com certeza ao ruído e não às ondas gravitacionais.

Usando apenas deslocamentos de tempo maiores do que 10 milissegundos (o tempo de percurso entre os dois detectores, o GW150914 foi detectado nos dois LIGO com uma diferencia de tempo de 7ms).

A taxa de falso alarme estimada é de um evento a cada 200.000 anos. Esta taxa de falso alarme pode ser traduzida pela conhecida variável ”Sigma” (indicada por σ) de uma distribuição normal Gaussiana fornecendo um valor de 5.1 vezes σ.

A primeira detecção de ondas gravitacionais e a primeira observação da fusão de um sistema de dois buracos negros são conquistas significativamente notáveis, mas representam apenas a primeira página em um excitante novo capítulo na astronomia.

Os projetos futuros incluem melhorias nos detectores LIGO Avançados e a extensão da rede global de detectores para incluir o Virgo Avançado, KAGRA, e um possível terceiro detector LIGO na Índia, o que irá melhorar significativamente a nossa capacidade de localizar posições de fontes de ondas gravitacionais no céu e estimar suas propriedade físicas. O novo campo da astronomia de ondas gravitacionais parece ter um futuro brilhante pela frente!

The LIGO Scientific and Virgo Collaborations, Observation of Gravitational Waves from a Binary Black Hole Merger, Phys. Rev. Lett. 116 (2016) 6, 061102 [arXiv:1602.03837 [gr-qc]].

Pesquisadores no Brasil contribuindo para a descoberta

Existem dois grupos no Brasil, ambos no estado de São Paulo, que participam oficialmente da LSC. O primeiro deles está na Divisão de Astrofísica do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), em São José dos Campos, órgão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e conta com seis membros e o outro no Instituto de Pesquisa Fundamental da América do Sul, filiado ao Centro Internacional de Física Teórica (sigla ICTP-SAIFR em inglês), localizado no IFT/UNESP, na cidade de São Paulo. O grupo do INPE dirigido por Odylio Aguilar trabalha no aperfeiçoamento da instrumentação de isolamento vibracional do LIGO, na sua futura operação com espelhos resfriados e na caracterização dos detectores, buscando determinar as suas fontes de ruído.

Já o grupo do ICTP-SAIFR/IFT-UNESP, dirigido por Riccardo Sturani, trabalha na modelagem e análise dos dados de sinais de sistemas estelares binários coalescentes. A modelagem é particularmente importante porque as ondas gravitacionais tem interação muito fraca com toda a matéria tornando necessárias, além de detectores de alto desempenho, técnicas de análises eficazes e uma modelagem teórica precisa dos sinais.

Detecção de ondas abre nova janela para observação do Universo

Written by ICTP-SAIFR on February 12th, 2016. Posted in Blog do ICTP-SAIFR

Grupo da Unesp colabora com pesquisa que comprovou teoria centenária de Albert Einstein

Por Marcos Jorge – Assessoria de Comunicação e Imprensa/UNESP

Pela primeira vez na história, cientistas detectaram ondas gravitacionais que confirmam as previsões realizadas por Albert Einstein em 1916, na sua Teoria Geral da Relatividade. O anúncio foi realizado na sede do National Science Foundation (NSF), nos Estados Unidos, e transmitido ao vivo no auditório do Instituto de Física Teórica (IFT) da Unesp, seguido de uma apresentação de Riccardo Sturani, pesquisador do IFT/Unesp e do ICTP-SAIFR (ICTP – South American Institute for Fundamental Research), envolvido com o projeto.


Leia entrevista do pesquisador Riccardo Sturani publicada em O Estado de S.Paulo de 12/2/2016:
http://ciencia.estadao.com.br/noticias/geral,foi-inesperado–diz-cientista-da-unesp-que-ajudou-a-detectar-ondas,10000015933

Leia entrevista com o pesquisdador no Portal UOL
http://noticias.uol.com.br/ciencia/ultimas-noticias/redacao/2016/02/12/e-como-ouvir-apos-surdez-diz-fisico-que-ajudou-a-provar-teoria-de-einstein.htm

Ouça Podcast com o pesquisador
Pesquisador da Unesp esclarece descobertas de ondas gravitacionais previstas por Einstein há cem anos
http://podcast.unesp.br/radiorelease-12022016-previstas-por-einstein-ha-cem-anos-pesquisador-da-unesp-esclarece-descobertas-de-ondas-gravitacionais


As ondas gravitacionais foram observadas no dia 14 de setembro de 2015 pelos detectores do Observatório Interferométrico de Ondas Gravitacionais (LIGO, do inglês Laser Interferometer Gravitational-wave Observatory), mas passaram por um criterioso processo de revisão antes de serem divulgadas ao público. Segundos os físicos ligados ao observatório, as ondas detectadas foram produzidas numa fração do último segundo da fusão de dois buracos negros com massa 30 vezes maior que a do Sol. Esta também foi a primeira vez que a colisão de dois buracos negros foi observada.

Durante o anúncio realizado em Washington, nos EUA, os fundadores do projeto LIGO destacaram que a detecção de ondas gravitacionais abre uma nova perspectiva para as pesquisas em astrofísica. Até então, a observação do universo tem sido feita com instrumentos que faziam leituras de ondas eletromagnéticas (como a luz ou o Raio-X).

A leitura inédita de ondas gravitacionais abre um campo completamente novo para “ouvir” o cosmos. “O que a história da astrofísica nos mostra é que cada vez que abrimos uma nova janela, algo fascinante foi descoberto”, afirmou Kip Thorne, co-fundador do projeto LIGO e pesquisador do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech). “Hoje, abrimos uma janela completamente nova para observar o universo”.

Brasil contribui para descoberta
Mais de 1000 pesquisadores de 15 países participam do consórcio responsável pela detecção inédita. No Brasil, um grupo do Instituto de Física Teórica  da Unesp e outro do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) colaboraram com a descoberta.

Riccardo Sturani, do IFT/UNESP, trabalha na modelagem e análise dos dados de sinais de sistemas estelares binários coalescentes (nome dado à interação entre os dois buracos negros que originaram as ondas gravitacionais detectadas). A modelagem é particularmente importante porque as ondas gravitacionais têm interação muito fraca com toda a matéria, tornando necessárias, além de detectores de alto desempenho, técnicas de análises eficazes e uma modelagem teórica precisa dos sinais.

O grupo do INPE, dirigido por Odylio Aguilar, trabalha no aperfeiçoamento da instrumentação de isolamento vibracional do LIGO, na sua futura operação com espelhos resfriados e na caracterização dos detectores, buscando determinar as suas fontes de ruído.

Palestra gratuita
Na próxima quinta-feira, 18 de fevereiro, às 19h, o pesquisador Riccardo Sturani, apresentará a palestra “Ondas Gravitacionais: começa uma nova astronomia”, no auditório do Instituto de Física Teórica da Unesp, na rua Dr. Bento Teobaldo Ferraz, 271, Barra Funda. A entrada é franca. O evento faz parte do programa Física ao Entardecer, palestras de divulgação científica para o público leigo que o IFT promove desde 1997.

Para entender melhor as ondas gravitacionais veja este vídeo legendado pelo professor Riccardo Sturani.

Processamento de dados
Sergio Novaes, diretor científico do NCC, aponta que o o GridUNESP foi a segunda estrutura computacional que mais contribuiu para o simulação dos dados do LIGO no Open Science Grid (OSG). “O GridUnesp é a única organização virtual (Virtual Organization, VO) do OSG fora dos EUA. E, logo após sua implantação, nos idos de 2010 e 2011, parte de nossa capacidade de processamento que estivesse livre, ou seja, que não estivesse sendo utilizada pelos pesquisadores da Unesp, era cedida para o processamento do nosso parceiro americano OSG e, consequentemente, para as demais VO’s como o LIGO”, explica o diretor do NCC.

Pode se ver no gráfico (acesse aqui) que o GridUNESP foi a segunda estrutura computacional que mais contribuiu para a simulação do experimento LIGO, logo após da contribuição do Fermi National Accelerator Laboratory de Chicago. “Foram realizadas quase 7,5 milhões de horas de processamento, o que equivale a 12,3% de todo seu processamento no OSG”, contabiliza Novaes.

Leia mais sobre a simulação dos dados do LIGO no OSG em: https://sciencenode.org/feature/osg-helps-ligo-confirm-einsteins-theory.php?clicked=readmore

Fonte: http://www.unesp.br/portal#!/noticia/20849/deteccao-de-ondas-abre-nova-janela-para-observacao-do-universo/